Não sei ao certo a razão, ou quando peguei gosto pela primavera, a estação do ano que nos ensina sobre mudanças, como se fosse um rito de passagem. Pode ter sido alguma experiência com minha família ou uma viagem, tenho sempre a suave lembrança de minha mãe, quando viajávamos ela ficava extasiada quando via árvores floridas, em especial o ipê amarelo, considerado um símbolo do Brasil, uma árvore nacional. Sua expressão de admiração era incansável, do tipo – Olha aquela árvore! Que maravilha! Logo em seguida, uma outra exclamação – Nossa, que flores lindas, é como se Deus estivesse enfeitando o mundo!
Dela tenho também tantas outras experiências vinculadas a flores e seu imenso amor por elas, quando costumava levá-la na festa de Morangos e das Flores em Atibaia, no Parque Edmundo Zanoni, não raro, via a Dona Odette lacrimejar diante daquelas tulipas, hortênsias, cravos, margaridas, malmequeres, sardinheiras, chorões, girassóis, dálias, hibiscos e, em especial as rosas e as orquídeas. Uma maravilha e que saudade.
A primavera me fascina em especial pela transformação que promove na natureza ressecada pelo vigor do inverno, quando vemos os campos amarelados, árvores sem folhas e sem flores, animais hibernados e fugindo do frio, tempo cinzento, parece até que as pessoas, de modo geral, ficam mais tristes e melancólicas.
Na primavera, não! Flores se abrindo, verde cobrindo as paisagens, os animais se animam para o acasalamento, há mais gorjeio de pássaros, como se a natureza se revitalizasse em um show esplendoroso de imagens, sons, da chuva que limpa o céu, das nuvens em seus movimentos sopradas pelos ventos, um impulso para nossa alma fluir em uma nova frequência, uma reernergização do espírito, da renovação da esperança.
Estamos diante de um cenário de momentos com grandes dificuldades no mundo, em nosso país, em nosso Estado, em nosso bairro, nas nossas famílias, impulsionadas pela pandemia do Covid-19 que nos assola.
Suas respectivas consequências, das perdas de entes queridos, do lamento e das lembranças, do trabalho em casa, da mudança de hábitos, desde o uso de máscaras, esfregar as mãos com álcool-gel, manter distanciamento das pessoas, evitar abraços e beijos, impondo-nos restrições das mais diversas. Ontem mesmo, foi o velório e o enterro da mãe de um amigo querido e meu desejo era estar lá, ao lado dele, levando meu consolo, o meu abraço, mas ele mesmo, em um ato de bondade e consciência disse que nem velório teria e que ao chegar no cemitério seria rapidamente enterrada, sem aquela cerimônia de despedida normal em outras circunstâncias e pediu que não fosse. Entendi, fiz minhas orações, disse por telefone palavras de consolo, enviei uma mensagem via internet.
As mudanças também estão ocorrendo no mercado de trabalho, com muita gente perdendo o emprego, muitas empresas não conseguindo pagar suas contas, mudanças nos seus sistemas de gestão e de trabalho, instituindo o home office, ou seja, trabalho em casa, em uma nova configuração de relação de prestação de serviços, com restrições em relação ao lazer, festas, eventos, jogos em estádios, entre outros. Um amigo ia se casar, estava tudo contratado, a festa, o padre, a cerimônia, a igreja, a viagem de lua de mel, mas diante dessa situação, adiou para daqui a um ano, na expectativa de que tudo isso tenha ficado para trás.
A tônica é se falar sobre o “novo normal”, que em verdade, ninguém sabe o que é, nem como será, mas que, de maneira geral, todos concordam que nada mais será como era antes, com um repensar de conceitos, comportamentos e atitudes.
Minha crença é que mais e mais, diante desse panorama de profundas reflexões, haverá uma maior atenção aos valores, ao respeito mútuo, ao reconhecer o quanto o outro é importante, um novo horizonte com menos egoísmo, com a oferta de ajuda e menos orgulho em aceitar o que outras pessoas oferecem de bom grado.
Curiosamente em alguns contextos, menos virou mais, por exemplo:
- Menos convívio social, mas mais convívio com familiares, em especial com os filhos;
- Menos viagens internacionais e nacionais, mas mais economia;
- E menos diversão externa em shows, cinemas, teatros, danceterias, mas mais diversão com os entes queridos;
- Menos TV e mais internet;
- Menos comidas enlatadas e mais qualidade no preparo de comidas mais saudáveis;
- E menos poluição e mais qualidade de vida.
Assim, com esse renovar gerado pela primavera, trazendo uma nova esperança, um novo olhar acalentador e recheado de beleza, que cada um possa mais profundamente fazer uma renovação interna, sendo mais atento aos reais problemas que nos assolam, mais conversa sobre quem devemos escolher para nos governar, é hora de uma transformação no cenário político, eliminando corruptos, extirpando essa turba de gente de mau caráter, que fizeram, ao longo do tempo a política como profissão, cuja preocupação principal não é com a comunidade, mas com a próxima eleição.
Que haja essa transformação de dentro para fora, pois aí reside o real poder de mudanças mais profundas.
Se cada um fizer a sua parte, passaremos por essas turbulências com tranquilidade e continuaremos a nossa vida com dignidade, deixando aos nossos sucessores uma nova concepção de qualidade de vida, menos impulsionada pela propaganda e mais focada nas reais necessidades, menos lixos tóxicos e mais consciência e a certeza de que estamos nesse planeta só de passagem e, enquanto aqui estivermos, possamos viver bem, com alegria, sentados à mesa como irmãos, cumprindo nossas obrigações e desfrutando os nossos direitos, acreditando na trilogia “ser, fazer e ter”, nessa ordem, como um lema existencial.
E lá no final, na nova mudança de estação, quando, a exemplo das flores que nascem na primavera e morrem no inverno, quando estivermos para deixar este mundo, possamos olhar para trás com um profundo sentimento de gratidão porque tivemos virtudes e valores e os colocamos em prática e, por isso, tivemos uma vida feliz, que valeu a pena ser vivida.
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